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domingo, 12 de outubro de 2008

Sessão Inaugural do Estágio Clínico - Ano Lectivo 2008/2009


Discurso proferido na Sessão Inaugural do Estágio Clínico da FML, no dia 10 de Outubro de 2008:



Exmo. Sr. Presidente do Conselho Científico da FML - Prof. Doutor H. Bicha-Castelo,
Exmo. Sr. Coordenador do Estágio Clínico do 6.º ano - Prof. Doutor Rui Victorino,
Exmo. Sr. Bastonário da Ordem dos Médicos - Dr. Pedro Nunes,
Exmo. Sr. Director Clínico do Centro Hospitalar Lisboa Norte – Prof. Doutor Correia da Cunha
Exmos. Sr. Coordenador da Área Cirúrgica do Estágio Clínico do 6.º Ano – Prof. Doutor Paulo Costa,
Exma. Sra. Chefe da Divisão Académica da FML – Dra. Ana Paula Pereira
Membros dos Orgãos da Gestão da FML e demais entidades representadas,
Docentes da FML,
Colegas do 6.º ano,


Muito bom dia a todos!

Não posso deixar de começar esta minha intervenção sem antes cumprimentar todos os colegas que agora chegam ao 6.º ano da FML – confesso já alguma nostalgia precoce dos tempos de faculdade.

Há exactamente um ano estava na vossa posição. Desde então nunca mais vi todos os meus colegas de curso juntos. É certo que não esperava outra coisa, nem tão pouco sei se faria sentido ou se houve contexto para isso acontecer; mas há uma série de memórias que me ocorrem e que me ligam ainda muito a esse lado – os colegas, as aulas, os exames, o estudo, as Noites da Medicina, as Olimpíadas de Medicina, a Benção das Fitas, toda a minha vida associativa na AEFML, na ANEM e na IFMSA; e todas as outras coisas que fazem parte da vida académica, fazendo parte da nossa também!

No fim de tudo isso quase que se faz um médico! Quase: porque como sabem há ainda, depois da licenciatura (para vocês mestrado integrado), alguns meses até ao início da vida profissional com uma prova pelo meio!

Pedem-me para reflectir convosco alguma da minha experiência no 6.º ano e há uma série de tópicos que gostaria de partilhar. Certo que algumas coisas ficarão por dizer, há algumas noções que julgo serem importantes:


1) A Diferença

O 6.º ano marca a diferença por vários aspectos:
a) A ausência de aulas teóricas e exclusividade de trabalho prático
b) O conhecimento in loco da prática efectiva da Medicina
c) A integração do aluno em equipas médicas de trabalho
d) A representação da pessoa doente e na pessoa doente

É todo um quadro que se conjuga na oportunidade de aplicar na prática muitos dos conhecimentos adquiridos, com a suposta supervisão dos respectivos tutores.

Nós próprios temos uma atitude diferente no cuidado com que avaliamos os doentes, discutimos as situações e, acima de tudo, na responsabilidade que sentimos pelos actos que praticamos.

A juntar a isto, tratam-nos de maneira diferente! Não é invulgar sermos abordados pelo pessoal não-médico e pelos doentes ouvindo a expressão “senhores doutores” que ainda não somos, contudo, aos olhos de quem nos chama, essa expressão acarreta muitas vezes a necessidade de respostas que muitas vezes não temos. Representamos de forma diferente daquela que fizemos até aqui, e julgo que nessa nova representação há uma maior proximidade com a realidade. Não tendo autonomia na decisão, somos responsáveis, mais que não seja, connosco próprios, e muitas vezes somos colocados em situações mais constrangedoras por via da ausência, ainda que de curta duração, da figura do tutor – temos de aprender a lidar com isso!


2) Os Estágios

Em rotatividade pré-estabelecida, ao longo do ano, vão frequentar vários estágios:
- Cirurgia Geral
- Ginecologia e Obstetrícia
- Medicina Interna
- Psiquiatria e Saúde Mental
- Medicina Geral e Familiar
- Pediatria

Grosso modo, a apreciação global da organização dos estágios é positiva. Acredito com convicção que esta pode ser a via de uniformização dos 6.º anos a nível das 7 escolas médicas que há muito se discute, e que muitos preconizam.

Mesmo assim, há ainda algumas arestas a limar, a principal das quais diz respeito ao maior volume de informação efectiva sobre os estágios por parte dos tutores no Hospital de Santa Maria, comparativamente com os restantes locais de estágio. Se podermos apontar esse ponto como uma falha, também podemos dizer que, na maioria dos casos, ela quase que fica colmatada por via da disponibilidade e boa-vontade dos tutores; por isso: aproveitem!

Na oportunidade de frequentar diferentes hospitais e centros de saúde, e de participar em enfermaria, consulta, bloco operatório, urgências (externas e internas); em caso de dúvida de vocação específica, que esta experiência vos sirva de primeira grande plataforma de entendimento.


3) A Avaliação

Ao longo do curso, não raras vezes ouvimos dizer que as notas de 6.º ano são sempre muito boas. Não nego que as médias dos estágios são elevadas, mas se tentar questionar o método de avaliação, tenho dificuldade em encontrar outro que melhor se adeque ao padrão em que o Estágio Clínico está construído.

Contudo, tão importante quanto a avaliação numérica é a avaliação pessoal do estágio nas nossas atitudes e valores e na nossa capacidade de raciocinar em Medicina.

Ao longo do estágio tentem ir aferindo os vossos conhecimentos e capacidades, numa relação próxima com o tutor – os tutores estão lá, estão disponíveis, mas se não-estimulados a ajudar-nos, muitas vezes o tempo passa e nós passamos também sem darmos muito bem conta como passámos por lá!


4) O Harrison e o Sahara

Nunca a expressão de Beauvoir fez tanto sentido: “Todas as vitórias ocultam uma abdicação”. Algumas, não muitas, algumas, muitas… são as abdicações que temos de fazer na busca de uma vitória incerta no exame… Até ao exame todas as outras vitórias parecem efémeras: fim do curso – felicidade – estudo, inscrição na Ordem – felicidade – estudo!

Daqui a pouco mais de um mês vou realizar essa prova. Depois de passada perguntem-me se o meu método resultou, quando é que se deve começar a estudar e todas essas coisas… podia dizer mil e uma, mas elas serviriam para uns e não para outros. Contudo, julgo que o segredo está na planificação e na tentativa de ir cumprindo objectivos de estudo a par e passo – mas não exagerem: desde o fim dos estágios até ao exame têm o Sahara para percorrer… e que grande é esse deserto!!!

No fim, e depois de muitas abdicações e de muito trabalho feito, esperamos ter um resultado positivo!


O meu reduzido período de licenciado, que ainda nem se traduziu por uma entrada no mercado de trabalho, não me permite ter aquelas expressões mais saudosas dos tempos de faculdade, mas há uma coisa que tenho a certeza: findos estes 6 anos há imediatamente uma série de sentimentos contraditórios que nos ocorrem – a felicidade por termos terminado e a nostalgia que vos falava ao início! Talvez essa nostalgia inicial se prenda muito com as nossas relações pessoais, mais do que com a instituição em termos de Ensino.

Em todo o caso, feita uma avaliação rápida pelas 7 escolas médicas, que bem conheço por via das funções associativas que tive, estou certo que a FML, apesar de poder oferecer ainda mais e melhor qualidade no seu Ensino, ocupa os lugares cimeiros dessa grelha – o Estágio Clínico Profissionalizante, de que a FML é pioneira, é uma dessas oportunidades ímpares de contacto com a realidade médica porque como dizia Bonaparte: “A capacidade pouco vale sem oportunidade”!

2 comentários:

Anónimo disse...

Há algum tempo que não passava por aqui, mas consegues sempre surpreender-me. Desejo-te muita sorte e sucesso nesta nova fase da tua vida. Beijinho*

Inês Simões disse...

Meu deus!!
Agora fizeste-me ter medo de um dia vir a ter saudades desta vida....

Adorei o texto. Para variar.